segunda-feira, 1 de março de 2021

O que você precisa saber sobre cotas raciais?

 Cotas raciais x cotas sociais Um dos principais argumentos de quem se opõe a esse tipo de ação afirmativa é dizer que "cotas deveriam ser apenas para pobres, independente da cor". Antes de entrar nessa discussão, é preciso separar desigualdade social de racismo. A desigualdade social está ligada, exclusivamente, a questões econômicas. É o que distancia as classes mais ricas das mais pobres. Já o racismo está relacionado à raça e envolve situações que vão além do poder financeiro. Para Humberto, esse pensamento de que cotas raciais não são necessárias revela que a pessoa "não consegue entender o ambiente de completa desigualdade que é fruto dos 300 anos de escravidão negra no país e que deixaram muitas marcas coletivas na sociedade". O especialista explica que essas marcas acabam refletindo na vida de pessoas pretas e pardas, que somadas compõe o grupo de negros (maioria da população). Segundo ele, o racismo institucional ou estrutural pode ser visto "por todos os lados que você olha na sociedade brasileira". "Eles (os negros) são a maioria da população que não vê refletida no seu quantitativo a importância da sua existência. E isso vai gerando outro tipo de repercussão, que são preconceitos e formas absurdamente intolerantes, racistas e criminosas, em relação à religião, ocupação de vagas de trabalho e ao próprio direito de ir e vir", relata. O advogado chama atenção para outro ponto em que o racismo se mostra presente: a quantidade de investimento público. Ele afirma que em áreas geográficas ocupadas por brasileiros pretos e pardos é investido menos dinheiro do que naquelas ocupadas por brancos. "O nome disso é racismo tributário. Você tem menos investimento em saúde, segurança, educação, moradia", explica. 

E, segundo Humberto, isso vai além da questões sociais. "Quando você afasta todas as variáveis de questão social, como ascensão de pessoas pretas ou pardas pelos seus méritos - com ação afirmativa ou não -, ainda resta lá um preconceito, um olhar, uma diminuição que só se explica pela questão racial. Há racismo nessas situações", afirma. As cotas ferem o princípio de igualdade previsto na Constituição? Outro argumento utilizado por quem é contra as cotas raciais é o princípio da isonomia ou igualdade, previsto em Constituição, que diz que todos são iguais sem distinção de qualquer natureza. Em 2009, o Democratas (DEM) ajuizou a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 186 contra as cotas raciais da Universidade de Brasília (UnB). O partido solicitou a suspensão liminar da ação afirmativa. Por unanimidade, o Supremo Tribunal Federal (STF) considerou as cotas constitucionais, julgando improcedente a ação ajuizada pelo DEM. Em 2017, o Supremo julgou a Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC) 41 e reconheceu, também com unanimidade, a validade da Lei de Cotas. Humberto frisa que é evidente como a política de cotas se enquadra no princípio constitucional da igualdade de "tratar os desiguais desigualmente". Segundo ele, apenas a "igualdade forma" resulta nas exclusões que estão presentes no sistema brasileiro. "Na Universidade de Brasília, onde eu estudei, havia 2% de estudantes negros, ou seja, para 98% não negros havia uma normalidade que não se enxerga na totalidade da população", exemplifica. Ele complementa dizendo que, para a maioria dos brancos, era absolutamente normal ocupar praticamente todas as vagas da universidade, mesmo representando proporcionalmente uma parcela menor da população brasileira. Cotas raciais favorecem negros e discriminam brancos pobres? Para Humberto, o branco pobre não era lembrado, assim como o negro. Porém, a partir das cotas raciais, ele passa a ser lembrado e também tem direito à cota social. No entanto, é preciso ponderar que são ações inclusivas, mas com focos diferentes, pois a questão racial vai além do financeiro.

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